terça-feira, 11 de março de 2014

A INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE DA INCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS

A discussão do tema aqui tratado já perfaz longos anos. O STJ, inclusive, já havia editado, em 1992 e 1994, respectivamente, as Súmulas nº 68 e 94, tendo em vista a legislação vigente à época relativa ao PIS e ao FINSOCIAL.

STJ Súmula nº 68 - 15/12/1992 - DJ 04.02.1993 - ICM - Base de Cálculo do PIS - A parcela relativa ao ICM inclui-se na base de cálculo do PIS.

STJ Súmula nº 94 - 22/02/1994 - DJ 28.02.1994 - ICMS - Base de Cálculo – FINSOCIAL - A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do FINSOCIAL.

Inclusive, é com base nessas súmulas que o STJ tem se posicionado pela possibilidade de inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, veja:

“(...) 2. O ICMS inclui-se na base de cálculo do PIS e da Cofins, conforme as Súmulas 68 e 94/STJ. 3. O reconhecimento de repercussão geral pelo egrégio STF não impede o julgamento dos recursos no STJ. Precedentes do STJ. 4. No que se refere à ADC 18/DF, o STF prorrogou a liminar lá concedida por 180 dias, ao julgar a terceira Questão de Ordem na Medida Cautelar. Na oportunidade, consignou expressamente que aquela seria a última prorrogação e que seu prazo deve ser contado a partir da publicação da ata de julgamento, ocorrida em 15.4.2010. 5. Essa última prorrogação esgotou-se em meados de outubro de 2010, razão pela qual não há como suspender o julgamento no âmbito do STJ. 6. O STJ tem entendido que a interpretação do conceito de faturamento para fins de incidência de contribuição ao PIS e à Cofins é matéria eminentemente constitucional, que foge da sua competência no âmbito do Recurso Especial. Precedentes: REsp 1.017.645/CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 10.9.2010; AgRg no REsp 1.224.734/RN, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 13.6.2012. 7. Agravo Regimental não provido.”
(STJ, AgRg no AREsp 314.177/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe 01/08/2013)

Contudo, em razão do passar dos anos e das várias modificações constitucionais e infraconstitucionais da legislação, impõe-se nova análise da possibilidade de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Inexistindo normas de maior força hierárquica que aquelas presentes na Constituição Federal, é a partir delas que devemos iniciar a análise do tema. É pacífico que a COFINS possui seu fundamento de validade no art. 195, inciso I, alínea b da CF, incluído pela EC nº 20/1998. A norma dispõe:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
b) a receita ou o faturamento;

Assim, a base de cálculo da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) deve ser equivalente à receita ou ao faturamento da empresa. O problema se instaura na conceituação destes institutos, surgindo a dúvida se existe um conceito constitucional pressuposto dos mesmos. Entretanto, considerando como premissa o fato da Constituição Federal não trazer palavras inúteis, temos que uma simples análise sintática do termo denota um significado. Portanto, nada mais lógico que reconhecer um conceito constitucionalmente pressuposto de “faturamento” e “receita”, o qual será analisado posteriormente.

 Já a contribuição destinada ao Programa de Integração Social (PIS) possui seu fundamento de validade no art. 239 da CF, o qual recepcionou expressamente a LC nº 07/1970, que instituiu o referido programa, onde a base de cálculo da contribuição equivale ao faturamento da empresa (art. 3º, alínea b da LC nº 07/1970).

Passando à análise da legislação infraconstitucional, temos que o FINSOCIAL, o PIS e a COFINS foram instituídas, respectivamente, pelo Decreto-Lei 1.940/82 (recepcionado pelo art. 56 da ADCT), LC nº 07/1970 e LC nº 70/91. Posteriormente, foi editada a Lei nº 9.718/98, a qual alterou parte da legislação regulamentadora destes tributos, modificando suas bases de cálculo ao prescrever que o faturamento correspondia “à receita bruta da pessoa jurídica", a qual compreenderia “a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas.” (arts. 2º e 3º, §1º). Daí já se poderia concluir que o conceito de faturamento diverge do conceito de receita, sendo este último mais abrangente, porquanto o primeiro refere-se apenas a receita bruta.

Após o advento da EC nº 20/1998, foram editadas as Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, respectivamente, referentes ao PIS e a COFINS. Ambas definiram a base de cálculo desses tributos como equivalentes ao faturamento das empresas, cuja definição foi fixada em seus arts. 1º como “o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.”

Entretanto, o STF, em 2006, através do RE 346.084/PR, declarou a inconstitucionalidade do §1º do art. 3º da Lei nº 9.718/98, sob o argumento de que o dispositivo ampliou sobremaneira o conceito de receita bruta, violando a noção de faturamento prevista no art. 195, inciso I, da Constituição da República. Naquele momento o STF reconheceu como sinônimas as expressões “faturamento” e “receita bruta” - espécies do gênero “receitas” – conceituando-as como o produto da venda de mercadorias e/ou da prestação de serviços.

CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º, § 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente. TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma pedagógica do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados os elementos tributários. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA - NOÇÃO - INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as expressões receita bruta e faturamento como sinônimas, jungindo-as à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada.
(STF, RE 346084/PR, Relator(a):  Min. ILMAR GALVÃO, DJ 01-09-2006 PP-00019)

Nada obstante, este dispositivo foi posteriormente revogado pela Lei nº 11.941/09. Dessa situação, depreende-se que faturamento não pressupõe todas as entradas financeiras do contribuinte, uma vez que o STF declarou expressamente que este conceito alarga a definição constitucional do termo trazida pelo art. 195, I, b. Pelo contrário, segundo a Corte Suprema, inseria-se naquele conceito apenas o produto advindo da venda das mercadorias. Todavia, mesmo este posicionamento vem se alterando. Confira excerto do voto da Min. Rosa Weber:

"Quanto ao conteúdo específico do conceito constitucional, a receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições, na esteira da clássica definição que Aliomar Baleeiro cunhou acerca do conceito de receita pública:
‘Receita pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondências no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo’.” (BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 16ª ed. Rio de Janeiro:  Forense, 2002, p. 126)"
(STF : RE 606107, Relator(a):  Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-231 DIVULG 22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013)

Destarte, para sabermos se o ICMS deve integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS é necessário verificar se ele está incluso no conceito de faturamento. Quanto ao tema, Roque Antônio Carrazza argumenta ser necessário buscar o conceito de faturamento no Direito Comercial, notadamente no art. 187, I da Lei nº 6.404/76, que se encontrava em vigor à época da promulgação da Constituição Federal. Veja suas conclusões:

“Ora, faturamento, para o Direito Comercial, para a doutrina e para a jurisprudência, nada mais é do que a expressão econômica de operações mercantis ou similares, realizadas, no caso em estudo, por empresas que, por imposição legal, sujeitam-se ao recolhimento do PIS e da COFINS.
O faturamento (que, etimologicamente, advém de fatura) corresponde, em última análise, ao somatório do valor das operações negociais realizadas pelo contribuinte. Faturar, pois, é obter receita bruta proveniente da venda de mercadorias ou, em alguns casos, da prestação de serviços.
Noutras palavras, faturamento é contrapartida econômica, auferida, como riqueza própria, pelas empresas em razão do desempenho de suas atividades típicas. Conquanto nesta contrapartida possa existir um componente que corresponde ao ICMS devido, ele não integra nem adere ao conceito de que ora estamos cuidando.” (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 14ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. Pg. 593.)

Destarte, para integrar o faturamento da empresa, a quantia pecuniária deve advir de operação negocial do contribuinte, caracterizada como riqueza própria, independentemente da destinação que este escolha lhe dar, seja para pagar seus empregados, as contas de energia elétrica ou quaisquer outras de suas despesas. portanto, o ICMS, ainda que embutido no preço do produto comercializado (art. 13, §1º da LC nº 87/96), não pode – em hipótese alguma – caracterizar riqueza própria do contribuinte, uma vez que este apenas repassará seu valor para o Poder Público. Desse modo, o valor do ICMS embutido no preço do produto só pode configurar ingresso de caixa, sem integrar efetivamente o faturamento da empresa. Trata-se apenas de entrada de dinheiro e não de entrada de receita.

Neste passo, interessante o voto do ilustre Relator do AMS 0013768-75.2007.4.01.3300/BA, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o qual abrange parte do voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio no julgamento do RE 240.785/MG, um dos leading cases em trâmite no STF. Confira:

“Assim, para se saber se o valor do ICMS pode ou não integrar a base de cálculo das aludidas exações, necessário se faz definir se o mesmo é abrangido pelo conceito de faturamento. O que não é possível, pois nenhum agente econômico fatura o imposto, mas apenas as mercadorias ou serviços para a venda. O valor do ICMS configura uma entrada de dinheiro e não receita da empresa, que apenas recebe o valor e o repassa ao Estado-Membro, não repercutindo efetivamente sobre o seu patrimônio.
Ou seja, a parcela correspondente ao ICMS, que constitui receita do Estado-Membro, não tem natureza de faturamento ou receita, mas de simples ingresso de caixa, não podendo compor a base de cálculo das referidas contribuições sociais.
Acerca do conceito de faturamento, cumpre destacar alguns trechos do voto proferido pelo Relator do mencionado Recurso Extraordinário, Ministro Marco Aurélio:
"(...) As expressões utilizadas no inciso I do artigo 195 em comento hão de ser tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e jurisprudencialmente. (...) Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços. (...) O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. (...) O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobra-lo. (...) Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento (...).
Concluiu o eminente Ministro que o ICMS “Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea "b" do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. (...) Conforme salientado pela melhor doutrina, "a Cofins só pode incidir sobre o faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas". A contrário-sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência. (...) Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se, na expressão "folha de salários", a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão "faturamento" envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. Admitir o contrário é querer (...) que a lei ordinária redefina conceitos utilizados por norma constitucional, alterando, assim, a Lei Maior e com isso afastando a supremacia que lhe é própria. (...) Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso. (...)"
Por tais fundamentos, tem-se que o valor relativo à arrecadação do ICMS, que é mero repasse dos ônus tributário do imposto embutido no preço da mercadoria, não se inclui na base de cálculo das contribuições sociais – FINSOCIAL, PIS e COFINS.”

Note que restou consignada a impossibilidade do agente econômico faturar os tributos, situação também levantada por Roque Antônio Carrazza em sua obra ICMS (14ª edição, pg. 596). Lado outro, ensinou que o valor arrecadado a título de ICMS, embutido no preço do produto vendido, constitui mero repasse do ônus tributário, porquanto receita pública destinada ao erário, o que impossibilita a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, haja vista dissonância do imposto com o conceito de faturamento. 

Ademais, o brilhante voto do Ministro Marco Aurélio aduz, inteligentemente, sobre a ausência de lógica na existência de tributo que, ao invés de incidir apenas sobre a vantagem que tem o contribuinte, incide também sobre seu ônus fiscal. Outrossim, evidente que esta situação onera excessivamente o contribuinte, que já se sujeita às altas cargas tributárias brasileiras, como é de sabença comum.

Salientou por fim que quem fatura receita advinda de ICMS é o estado e não o contribuinte, corroborando com os argumentos por nós expostos anteriormente. Aliás, a inclusão do ICMS na base de cálculo dessas contribuições sociais leva a inevitável consequência de obrigação do contribuinte a arrecadar tributo apurado sobre valores que nem mesmo lhe pertencem, constituindo receita de terceiros, o que é inaceitável.

Por outro lado, por que não se pode dizer que o valor do ICMS, ainda que compondo o preço, não ingressa no patrimônio do contribuinte como elemento novo e positivo, ou seja, sem reservas ou condições, nos termos do voto proferido pela Min. Rosa Weber (RE 606107)? Em razão do disposto no art. 13, § 1º da LC nº 87/96, veja:

LC 87/96, Art. 13, § 1º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)
I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de CONTROLE;

Se o ICMS próprio do contribuinte tem seu ingresso controlado no caixa do contribuinte, não se pode dizer que isto ocorra sem “reservas ou condições”. O ICMS, portanto, não pode ser incluído no conceito de receita. Como visto, trata-se apenas de ingresso financeiro por natureza jurídica controlada, tudo objetivando o acompanhamento de sua fiel destinação ao ente político, sujeito ativo da respectiva obrigação tributária.

Destarte, concluí-se que nem mesmo as Leis nº 10.637/02 e 10.833/03 (art. 1º, § 1º) podem restringir a regra de competência constitucional, na medida em que, ao atribuir como base de cálculo do PIS e da COFINS, o faturamento mensal (sinônimo de receita bruta, nos termos do STF), assim entendido o total das receitas próprias auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, não pode atingir receitas que não pertencem ao contribuinte, como é o caso do ICMS.

Por todo o exposto, considerando-se o lapso temporal entre a edição das Súmulas 68 e 94 do STJ – que datam do início da década de 90 – e o momento presente, bem como a edição de nova legislação e novos posicionamentos jurisprudenciais sobre o tema, não há como se sustentar os entendimentos manifestados nas mesmas, as quais – data maxima venia – encontram-se extremamente obsoletas. De fato, sua aplicação hodierna remeteria ao contexto social existente à época, o qual se alterou bastante após 20 anos. Com vistas a isto, a jurisprudência vem se atualizando.

No STF tramita a ADC nº 18/DF que trata justamente deste tema, a qual ainda não foi julgada. Nada obstante, também tramita o RE 240.785/MG, um dos principais leading cases da Corte Suprema sobre o caso, cujo julgamento já foi iniciado. O Ministro Marco Aurélio, relator, proferiu voto entendendo que o ICMS não está incluso no conceito de faturamento e, portanto, não integra a base de cálculo da COFINS. Todavia, o julgamento foi interrompido em virtude do pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes. 

Das manifestações do STF nos casos aqui citados, as quais constituem indícios do pensamento daquela Corte, concluímos que o Tribunal se aproxima do momento em que decidirá, definitivamente, sobre a impossibilidade de inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, uma vez que já firmou ser restritivo o conceito de faturamento. Sinal evidente disso é o elucidativo voto do Ministro Marco Aurélio quanto ao tema, atualizando a jurisprudência.

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por sua vez, está consolidando sua jurisprudência no sentido de excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, com fulcro nos mesmos fundamentos aqui apresentados, baseando-se especialmente no referido voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio, embora ainda existam votos contrários. Confira:

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS E COFINS. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO. RE 240.785/MG. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. AÇÃO AJUIZADA APÓS LC 118/2005. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PRECEDENTES. REMESSA OFICIAL, APELAÇÃO DA UNIÃO E APELAÇÃO ADESIVA, IMPROVIDAS.  1. A retomada do curso das demandas que têm como objeto a exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e/ou COFINS deriva do vencimento do prazo de suspensão (e prorrogação) determinado pelo STF na MC-ADC nº 18/DF; é o entendimento da 4ª Seção do TRF1, no EIAC nº 2006.38.06.004793-7/MG. 
2. Não obstante ter o Superior Tribunal de Justiça, no passado, fixado jurisprudência no sentido da legalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS com edição das Súmulas nº 68 e 98, a Corte Suprema, no julgamento do Recurso Extraordinário número 240.785-MG, passou a analisar a tese sob o prisma da inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições, sendo levada a sessão plenária em 22 de março de 2006, que, no mérito, seis ministros votaram a favor dos contribuintes, ou seja, a maioria da Corte, com apenas um voto contra, sendo o julgamento suspenso em virtude do pedido de vistas do Ministro Gilmar Mendes. 
3. O conceito de faturamento, como base de cálculo das referida contribuições, foi muito bem formulado no voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio no Recurso Extraordinário nº 240.785-MG: O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. 
4. O ICMS não integra a base de cálculo do FINSOCIAL, PIS e COFINS, vez que nenhum agente econômico fatura o imposto, mas apenas as mercadorias ou serviços para a venda. O valor do ICMS configura uma entrada de dinheiro e não receita da empresa, que apenas recebe o valor e o repassa ao Estado-Membro, não repercutindo efetivamente sobre o seu patrimônio. A parcela correspondente ao ICMS, que constitui receita do Estado-Membro, não tem natureza de faturamento ou receita, mas de simples ingresso de caixa, não podendo compor a base de cálculo das referidas contribuições sociais. Nesse sentido: O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. (RE 240.785/MG. Precedentes do TRF-1ª Região: AMS 0000835-32.2006.4.01.3809 / MG; Rel. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso; e-DJF1 de 22/02/2013; p.575. E AR 0007794-58.2010.4.01.0000; rel. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, e-DJF1 de 08/02/2013; p. 1023). 
5. Reconhecida a não inclusão do ICMS na base das contribuições sociais - FINSOCIAL (exigível até março/1992), PIS e COFINS - e tendo a apelante requerido a compensação de tal indébito com tributos de mesma espécie, nos termos disciplinados no art. 66 da Lei 8.383/91, resta acolhido o pedido de compensação dos valores indevidamente recolhidos a este título com iguais contribuições, condicionada ao trânsito em julgado (art. 170-A, CTN).
6. Aplicada a prescrição qüinqüenal, por se tratar de ação ajuizada posteriormente à vigência da LC n. 118/2005. Correção Monetária pelos índices adotados pela taxa SELIC.  7 . Remessa oficial, apelação da União e apelação adesiva, improvidas. 
(AMS 0013768-75.2007.4.01.3300 / BA, Rel. JUIZ FEDERAL ITELMAR RAYDAN EVANGELISTA, 6ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.1898 de 06/12/2013)


PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS APELAÇÃO NÃO CONHECIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA. EFEITO INFRINGENTE. ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO PIS E COFINS. PRESCRIÇÃO.  1. É nulo o acórdão que apreciou pedido diverso do contido na petição inicial.  2. Proposta a ação antes de 09/06/2005, a prescrição é decenal, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - RE 566.621, r. Ministra Ellen Gracie, Plenário.  3. É indevida a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS (Nesse sentido: voto do r. Ministro Marco Aurélio no RE 240.785-2-MG).  4. Embargos declaratórios da impetrante providos com efeito infringente. Apelação provida.
(EDAMS 0017167-75.1999.4.01.3500 / GO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA, OITAVA TURMA, e-DJF1 p.1359 de 14/11/2013)

Por todo o exposto, embora a jurisprudência pátria ainda não esteja efetivamente consolidada, evidente que esta caminha para o momento em que reconhecerá a impossibilidade de inclusão do ICMS na base de cálculo das referidas contribuições sociais.