A discussão do tema aqui tratado já
perfaz longos anos. O STJ, inclusive, já havia editado, em 1992 e 1994,
respectivamente, as Súmulas nº 68 e 94, tendo em vista a legislação vigente à
época relativa ao PIS e ao FINSOCIAL.
STJ Súmula nº 68 - 15/12/1992 -
DJ 04.02.1993 - ICM - Base de Cálculo
do PIS - A parcela relativa ao ICM inclui-se na base de cálculo do PIS.
STJ Súmula nº 94 - 22/02/1994
- DJ 28.02.1994 - ICMS - Base de
Cálculo – FINSOCIAL - A parcela relativa ao ICMS inclui-se na
base de cálculo do FINSOCIAL.
Inclusive, é com base nessas súmulas
que o STJ tem se posicionado pela possibilidade de inclusão do ICMS na base de
cálculo do PIS e da COFINS, veja:
“(...)
2. O ICMS inclui-se na base de cálculo
do PIS e da Cofins, conforme as Súmulas 68 e 94/STJ. 3. O reconhecimento de
repercussão geral pelo egrégio STF não impede o julgamento dos recursos no STJ.
Precedentes do STJ. 4. No que se refere à ADC 18/DF, o STF prorrogou a
liminar lá concedida por 180 dias, ao julgar a terceira Questão de Ordem na
Medida Cautelar. Na oportunidade, consignou expressamente que aquela seria a
última prorrogação e que seu prazo deve ser contado a partir da publicação da
ata de julgamento, ocorrida em 15.4.2010. 5. Essa última prorrogação esgotou-se
em meados de outubro de 2010, razão pela qual não há como suspender o
julgamento no âmbito do STJ. 6. O STJ tem entendido que a interpretação do
conceito de faturamento para fins de incidência de contribuição ao PIS e à
Cofins é matéria eminentemente constitucional, que foge da sua competência no
âmbito do Recurso Especial. Precedentes: REsp 1.017.645/CE, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, DJe 10.9.2010; AgRg no REsp 1.224.734/RN, Rel. Ministro
Arnaldo Esteves Lima, DJe 13.6.2012. 7. Agravo Regimental não provido.”
(STJ, AgRg no AREsp 314.177/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe 01/08/2013)
Contudo, em razão do passar dos anos e
das várias modificações constitucionais e infraconstitucionais da legislação,
impõe-se nova análise da possibilidade de exclusão do ICMS da base de cálculo
do PIS e da COFINS.
Inexistindo normas de maior força
hierárquica que aquelas presentes na Constituição
Federal, é a partir delas que devemos iniciar a análise do tema. É pacífico
que a COFINS possui seu fundamento de validade no art. 195, inciso I, alínea b
da CF, incluído pela EC nº 20/1998. A norma dispõe:
Art.
195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta
e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela
equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
b) a
receita ou o faturamento;
Assim, a base de cálculo da Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) deve ser equivalente à
receita ou ao faturamento da empresa. O problema se instaura na conceituação
destes institutos, surgindo a dúvida se existe um conceito constitucional
pressuposto dos mesmos. Entretanto, considerando como premissa o fato da
Constituição Federal não trazer palavras inúteis, temos que uma simples análise
sintática do termo denota um significado. Portanto, nada mais lógico que
reconhecer um conceito constitucionalmente pressuposto de “faturamento” e
“receita”, o qual será analisado posteriormente.
Já
a contribuição destinada ao Programa de Integração Social (PIS) possui seu
fundamento de validade no art. 239 da CF, o qual recepcionou expressamente a LC nº 07/1970, que instituiu o referido programa, onde a base de cálculo da
contribuição equivale ao faturamento da empresa (art. 3º, alínea b da LC nº 07/1970).
Passando
à análise da legislação
infraconstitucional, temos que o
FINSOCIAL, o PIS e a COFINS foram instituídas, respectivamente, pelo
Decreto-Lei 1.940/82 (recepcionado pelo art. 56 da ADCT), LC nº 07/1970 e LC nº 70/91. Posteriormente, foi
editada a Lei nº 9.718/98, a qual alterou parte da legislação regulamentadora
destes tributos, modificando suas bases de cálculo ao prescrever que o
faturamento correspondia “à receita bruta da pessoa jurídica", a qual
compreenderia “a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo
irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil
adotada para as receitas.” (arts. 2º e 3º, §1º). Daí já se poderia concluir que o conceito de faturamento diverge do conceito de receita, sendo este último mais abrangente, porquanto o primeiro refere-se apenas a receita bruta.
Após o advento da EC nº 20/1998, foram editadas as Leis nº 10.637/2002
e 10.833/2003, respectivamente, referentes ao PIS e a COFINS. Ambas definiram a
base de cálculo desses tributos como equivalentes ao faturamento das empresas,
cuja definição foi fixada em seus arts. 1º como “o total das receitas auferidas
pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação
contábil.”
Entretanto, o STF, em 2006, através do RE
346.084/PR, declarou a inconstitucionalidade do §1º do art. 3º da Lei nº
9.718/98,
sob o argumento de que o dispositivo ampliou sobremaneira o conceito de receita
bruta, violando a noção de faturamento prevista no art. 195, inciso I, da
Constituição da República. Naquele momento o STF reconheceu como sinônimas
as expressões “faturamento” e “receita bruta” - espécies do gênero
“receitas” – conceituando-as como o produto da venda de mercadorias e/ou da
prestação de serviços.
CONSTITUCIONALIDADE
SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º, § 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 -
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico
brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente.
TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma pedagógica
do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei
tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados
institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou
implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados
os elementos tributários. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA - NOÇÃO -
INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A
jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal
anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as
expressões receita bruta e faturamento como sinônimas, jungindo-as à venda de
mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o §
1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta
para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas,
independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação
contábil adotada.
(STF, RE
346084/PR, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, DJ 01-09-2006 PP-00019)
Nada obstante, este dispositivo foi posteriormente revogado
pela Lei nº 11.941/09. Dessa situação, depreende-se que faturamento não pressupõe todas as entradas financeiras do contribuinte, uma vez que o STF declarou expressamente que este conceito alarga a
definição constitucional do termo trazida pelo art. 195, I, b. Pelo
contrário, segundo a Corte Suprema, inseria-se naquele conceito apenas o
produto advindo da venda das mercadorias. Todavia, mesmo este posicionamento
vem se alterando. Confira excerto do voto da Min. Rosa Weber:
"Quanto
ao conteúdo específico do conceito constitucional, a receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se
integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou
condições, na esteira da clássica definição que Aliomar Baleeiro cunhou
acerca do conceito de receita pública:
‘Receita
pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer
reservas, condições ou correspondências no passivo, vem acrescer o seu vulto,
como elemento novo e positivo’.” (BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência
das finanças. 16ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2002, p. 126)"
(STF
: RE 606107, Relator(a): Min. ROSA
WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-231 DIVULG
22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013)
Destarte, para sabermos se o ICMS deve integrar a
base de cálculo do PIS e da COFINS é necessário verificar se ele está incluso
no conceito de faturamento. Quanto ao tema, Roque Antônio Carrazza
argumenta ser necessário buscar o conceito de faturamento no Direito Comercial,
notadamente no art. 187, I da Lei nº 6.404/76, que se encontrava em vigor à
época da promulgação da Constituição Federal. Veja suas conclusões:
“Ora, faturamento, para o Direito Comercial, para a
doutrina e para a jurisprudência, nada mais é do que a expressão econômica de
operações mercantis ou similares, realizadas, no caso em estudo, por empresas
que, por imposição legal, sujeitam-se ao recolhimento do PIS e da COFINS.
O faturamento
(que, etimologicamente, advém de fatura)
corresponde, em última análise, ao somatório
do valor das operações negociais realizadas pelo contribuinte. Faturar, pois, é obter receita bruta proveniente da venda de
mercadorias ou, em alguns casos, da prestação de serviços.
Noutras palavras, faturamento é contrapartida econômica, auferida, como riqueza própria, pelas empresas
em razão do desempenho de suas atividades típicas. Conquanto nesta
contrapartida possa existir um componente que corresponde ao ICMS devido, ele
não integra nem adere ao conceito de que ora estamos cuidando.” (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 14ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. Pg. 593.)
Destarte, para integrar o faturamento da empresa, a
quantia pecuniária deve advir de operação negocial do contribuinte,
caracterizada como riqueza própria, independentemente da destinação que
este escolha lhe dar, seja para pagar seus empregados, as contas de energia
elétrica ou quaisquer outras de suas despesas. portanto, o ICMS, ainda que
embutido no preço do produto comercializado (art. 13, §1º da LC nº 87/96), não pode –
em hipótese alguma – caracterizar riqueza própria do contribuinte, uma vez que
este apenas repassará seu valor para o Poder Público. Desse modo, o valor do
ICMS embutido no preço do produto só pode configurar ingresso de caixa,
sem integrar efetivamente o faturamento da empresa. Trata-se apenas de
entrada de dinheiro e não de entrada de receita.
Neste passo, interessante o voto do ilustre Relator
do AMS 0013768-75.2007.4.01.3300/BA, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região,
o qual abrange parte do voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio no
julgamento do RE 240.785/MG, um dos leading
cases em trâmite no STF. Confira:
“Assim,
para se saber se o valor do ICMS pode ou não integrar a base de cálculo das
aludidas exações, necessário se faz definir se o mesmo é abrangido pelo
conceito de faturamento. O que não é possível, pois nenhum agente econômico
fatura o imposto, mas apenas as mercadorias ou serviços para a venda. O
valor do ICMS configura uma entrada de dinheiro e não receita da empresa, que
apenas recebe o valor e o repassa ao Estado-Membro, não repercutindo
efetivamente sobre o seu patrimônio.
Ou
seja, a parcela correspondente ao ICMS, que constitui receita do Estado-Membro,
não tem natureza de faturamento ou receita, mas de simples ingresso de caixa,
não podendo compor a base de cálculo das referidas contribuições sociais.
Acerca do conceito de faturamento, cumpre
destacar alguns trechos do voto proferido pelo Relator do mencionado Recurso
Extraordinário, Ministro Marco Aurélio:
"(...)
As expressões utilizadas no inciso I do artigo 195 em comento hão de ser
tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e
jurisprudencialmente. (...) Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito
constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Este decorre, em
si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que
percebido por aquele que a realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo
a prestação de serviços. (...) O conceito de faturamento diz com riqueza
própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de
mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o
envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta.
(...) O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de
direito público que tem a competência para cobra-lo. (...) Difícil é
conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que
mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus como é o ônus
fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a
natureza de faturamento (...).
Concluiu o
eminente Ministro que o ICMS “Não pode, então, servir à incidência da Cofins,
pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito
da alínea "b" do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.
(...) Conforme salientado pela melhor doutrina, "a Cofins só pode incidir
sobre o faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das
operações negociais realizadas". A contrário-sensu, qualquer valor diverso
deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para
o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional
mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao
sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina
e pela jurisprudência. (...) Da mesma forma que esta Corte excluiu a
possibilidade de ter-se, na expressão "folha de salários", a inclusão
do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão
maior, entender que a expressão "faturamento" envolve, em si, ônus
fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo
constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição,
relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer
de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém
fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. Admitir o
contrário é querer (...) que a lei ordinária redefina conceitos utilizados por
norma constitucional, alterando, assim, a Lei Maior e com isso afastando a
supremacia que lhe é própria. (...) Olvidar os parâmetros próprios ao
instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e,
mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da
contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado,
isso sim, um desembolso. (...)"
Por
tais fundamentos, tem-se que o valor relativo à arrecadação do ICMS, que é mero
repasse dos ônus tributário do imposto embutido no preço da mercadoria, não se
inclui na base de cálculo das contribuições sociais – FINSOCIAL, PIS e COFINS.”
Note que restou consignada a impossibilidade do
agente econômico faturar os tributos, situação também levantada por Roque
Antônio Carrazza em sua obra ICMS (14ª edição, pg. 596). Lado outro, ensinou
que o valor arrecadado a título de ICMS, embutido no preço do produto vendido,
constitui mero repasse do ônus tributário, porquanto receita pública
destinada ao erário, o que impossibilita a inclusão do ICMS na base de cálculo
do PIS e da COFINS, haja vista dissonância do imposto com o conceito de
faturamento.
Ademais, o brilhante voto do Ministro Marco Aurélio
aduz, inteligentemente, sobre a ausência de lógica na existência de tributo
que, ao invés de incidir apenas sobre a vantagem que tem o contribuinte, incide
também sobre seu ônus fiscal. Outrossim, evidente que esta situação onera
excessivamente o contribuinte, que já se sujeita às altas cargas tributárias
brasileiras, como é de sabença comum.
Salientou por fim que quem fatura receita advinda
de ICMS é o estado e não o contribuinte, corroborando com os argumentos por
nós expostos anteriormente. Aliás, a inclusão do ICMS na base de cálculo dessas
contribuições sociais leva a inevitável consequência de obrigação do
contribuinte a arrecadar tributo apurado sobre valores que nem mesmo lhe
pertencem, constituindo receita de terceiros, o que é inaceitável.
Por outro lado, por que
não se pode dizer que o valor do ICMS, ainda que compondo o preço, não ingressa no patrimônio do
contribuinte como elemento novo e positivo, ou seja, sem reservas ou condições, nos termos do voto proferido pela Min. Rosa Weber (RE 606107)?
Em razão do disposto no art. 13, § 1º da LC nº 87/96, veja:
LC 87/96, Art. 13, § 1º Integra a base de cálculo do
imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: (Redação dada
pela Lcp 114, de 16.12.2002)
I - o montante do próprio imposto, constituindo
o respectivo destaque mera indicação para fins de CONTROLE;
Se o ICMS próprio do
contribuinte tem seu ingresso controlado no caixa do
contribuinte, não se pode dizer que isto ocorra sem “reservas ou condições”. O
ICMS, portanto, não pode ser incluído no conceito de receita. Como visto,
trata-se apenas de ingresso financeiro por natureza jurídica controlada,
tudo objetivando o acompanhamento de sua fiel destinação ao ente político, sujeito ativo da respectiva obrigação tributária.
Destarte, concluí-se que nem mesmo as Leis nº 10.637/02
e 10.833/03 (art. 1º, § 1º) podem restringir a regra de competência
constitucional, na medida em que, ao atribuir como base de cálculo do PIS e da
COFINS, o faturamento mensal (sinônimo de receita bruta, nos termos do STF), assim entendido o total das receitas próprias auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de
sua denominação ou classificação contábil, não pode atingir receitas que não
pertencem ao contribuinte, como é o caso do ICMS.
Por todo o exposto, considerando-se
o lapso temporal entre a edição das Súmulas 68 e 94 do STJ – que datam do
início da década de 90 – e o momento presente, bem como a edição de nova
legislação e novos posicionamentos jurisprudenciais sobre o tema, não há como
se sustentar os entendimentos manifestados nas mesmas, as quais – data maxima venia – encontram-se
extremamente obsoletas. De fato, sua aplicação hodierna remeteria ao contexto
social existente à época, o qual se alterou bastante após 20 anos. Com vistas a
isto, a jurisprudência vem se atualizando.
No STF tramita a ADC
nº 18/DF que trata justamente deste tema, a qual ainda não foi julgada.
Nada obstante, também tramita o RE
240.785/MG, um dos principais leading
cases da Corte Suprema sobre o caso, cujo julgamento já foi iniciado. O
Ministro Marco Aurélio, relator, proferiu voto entendendo que o ICMS não está
incluso no conceito de faturamento e, portanto, não integra a base de cálculo
da COFINS. Todavia, o julgamento foi interrompido em virtude do pedido de vista
do Ministro Gilmar Mendes.
Das manifestações do STF nos casos aqui citados, as quais
constituem indícios do pensamento daquela Corte, concluímos que o Tribunal se
aproxima do momento em que decidirá, definitivamente, sobre a impossibilidade
de inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, uma vez que já
firmou ser restritivo o conceito de faturamento. Sinal evidente disso é o
elucidativo voto do Ministro Marco Aurélio quanto ao tema, atualizando a
jurisprudência.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por
sua vez, está consolidando sua jurisprudência no sentido de excluir o ICMS da
base de cálculo do PIS e da COFINS, com fulcro nos mesmos fundamentos aqui
apresentados, baseando-se especialmente no referido voto proferido pelo
Ministro Marco Aurélio, embora ainda existam votos contrários. Confira:
TRIBUTÁRIO.
MANDADO DE SEGURANÇA. PIS E COFINS. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO. RE
240.785/MG. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. AÇÃO AJUIZADA APÓS LC 118/2005.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PRECEDENTES. REMESSA OFICIAL, APELAÇÃO DA UNIÃO E
APELAÇÃO ADESIVA, IMPROVIDAS. 1. A retomada
do curso das demandas que têm como objeto a exclusão do ICMS das bases de
cálculo do PIS e/ou COFINS deriva do vencimento do prazo de suspensão (e
prorrogação) determinado pelo STF na MC-ADC nº 18/DF; é o entendimento da 4ª
Seção do TRF1, no EIAC nº 2006.38.06.004793-7/MG.
2. Não obstante ter o Superior
Tribunal de Justiça, no passado, fixado jurisprudência no sentido da legalidade
da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS com
edição das Súmulas nº 68 e 98, a Corte Suprema, no julgamento do Recurso
Extraordinário número 240.785-MG, passou a analisar a tese sob o prisma da
inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições,
sendo levada a sessão plenária em 22 de março de 2006, que, no mérito, seis
ministros votaram a favor dos contribuintes, ou seja, a maioria da Corte, com
apenas um voto contra, sendo o julgamento suspenso em virtude do pedido de
vistas do Ministro Gilmar Mendes.
3. O conceito de faturamento, como
base de cálculo das referida contribuições, foi muito bem formulado no voto
proferido pelo Ministro Marco Aurélio no Recurso Extraordinário nº 240.785-MG: O
conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos
cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços,
implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende
como receita bruta.
4. O ICMS não
integra a base de cálculo do FINSOCIAL, PIS e COFINS, vez que nenhum agente
econômico fatura o imposto, mas apenas as mercadorias ou serviços para a venda.
O valor do ICMS configura uma entrada de dinheiro e não receita da empresa, que
apenas recebe o valor e o repassa ao Estado-Membro, não repercutindo
efetivamente sobre o seu patrimônio. A parcela correspondente ao ICMS, que
constitui receita do Estado-Membro, não tem natureza de faturamento ou receita,
mas de simples ingresso de caixa, não podendo compor a base de cálculo das
referidas contribuições sociais. Nesse sentido: O conceito de faturamento diz
com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à
venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o
envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. (RE
240.785/MG. Precedentes do TRF-1ª Região: AMS 0000835-32.2006.4.01.3809 / MG;
Rel. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso; e-DJF1 de 22/02/2013;
p.575. E AR 0007794-58.2010.4.01.0000; rel. Desembargador Federal Luciano
Tolentino Amaral, e-DJF1 de 08/02/2013; p. 1023).
5. Reconhecida a não inclusão do ICMS
na base das contribuições sociais - FINSOCIAL (exigível até março/1992), PIS e
COFINS - e tendo a apelante requerido a compensação de tal indébito com
tributos de mesma espécie, nos termos disciplinados no art. 66 da Lei 8.383/91,
resta acolhido o pedido de compensação dos valores indevidamente recolhidos a
este título com iguais contribuições, condicionada ao trânsito em julgado (art.
170-A, CTN).
6.
Aplicada a prescrição qüinqüenal, por se tratar de ação ajuizada posteriormente
à vigência da LC n. 118/2005. Correção Monetária pelos índices adotados pela
taxa SELIC. 7 . Remessa oficial,
apelação da União e apelação adesiva, improvidas.
(AMS
0013768-75.2007.4.01.3300 / BA, Rel. JUIZ FEDERAL ITELMAR RAYDAN EVANGELISTA,
6ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.1898 de 06/12/2013)
PROCESSUAL
CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS APELAÇÃO NÃO CONHECIDA EM MANDADO DE
SEGURANÇA. EFEITO INFRINGENTE. ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO PIS E COFINS.
PRESCRIÇÃO. 1. É nulo o acórdão que
apreciou pedido diverso do contido na petição inicial. 2. Proposta a ação antes de 09/06/2005, a
prescrição é decenal, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal -
RE 566.621, r. Ministra Ellen Gracie, Plenário. 3. É indevida a inclusão do
ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS (Nesse sentido: voto do r. Ministro
Marco Aurélio no RE 240.785-2-MG).
4. Embargos declaratórios da impetrante providos com efeito infringente.
Apelação provida.
(EDAMS
0017167-75.1999.4.01.3500 / GO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA,
OITAVA TURMA, e-DJF1 p.1359 de 14/11/2013)
Por todo o exposto, embora a
jurisprudência pátria ainda não esteja efetivamente consolidada, evidente que
esta caminha para o momento em que reconhecerá a impossibilidade de inclusão do
ICMS na base de cálculo das referidas contribuições sociais.