sexta-feira, 4 de março de 2016

Cautelar de Antecipação de Penhora

Após a inscrição do crédito tributário em Dívida Ativa – seja federal, estadual ou municipal – a propositura da execução fiscal não é automática. Todavia, tal inscrição impede a expedição de Certidão Negativa de Débito (CND), consta do CADIN e do Serasa, mantém eventual processo administrativo de arrolamento de bens, dentre outros infortúnios. Assim, neste interregno, o contribuinte pode ser imensamente prejudicado. Por exemplo, se se tratar de uma empresa que pretende participar de licitações, ela não terá como comprovar sua regularidade fiscal (art. 27, IV da Lei n. 8.666/93).
Todavia, para que não fique de mãos atadas ante a inércia do Poder Público, o contribuinte pode ajuizar Ação Cautelar de Antecipação de Penhora (art. 801 do CPC). Nesta, pode-se oferecer um bem para recair a penhora (art. 9º da Lei nº 6.830/80), observando-se a ordem legal (art. 11º da Lei n. 6.830/80), e usufruir dos benefícios que a garantia do crédito tributário traz como, por exemplo, a obtenção de Certidão Positiva de Débitos com Efeito de Negativa (CPD-EN), consoante permitem os arts. 205 e 206 do CTN.
A medida se justifica na impossibilidade de se ferir os princípios da universalidade de jurisdição, do contraditório e ampla defesa - dentre outros - obrigando o contribuinte, após ser vencido na esfera administrativa, a quitar imediatamente o débito para que sua atividade não seja prejudicada. Tal situação evidencia coação indireta ao pagamento sem discussão judicial, o que é vedado pelo STF.
Inclusive, a jurisprudência há muito pacificou-se no sentido de admitir o ajuizamento de Medida Cautelar para o oferecimento de caução, antes de ajuizada a execução fiscal. Nesse sentido, veja a ementa abaixo, cujo processo foi submetido ao regime do art. 543-C do CPC:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. AÇÃO CAUTELAR PARA ASSEGURAR A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE. INSUFICIÊNCIA DA CAUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa. (Precedentes: EDcl no AgRg no REsp 1057365/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/08/2009, DJe 02/09/2009; EDcl nos EREsp 710.153/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 01/10/2009; REsp 1075360/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009; AgRg no REsp 898.412/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 13/02/2009; REsp 870.566/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 11/02/2009; REsp 746.789/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 24/11/2008; EREsp 574107/PR, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ 07.05.2007)
2. Dispõe o artigo 206 do CTN que: "tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa." A caução oferecida pelo contribuinte, antes da propositura da execução fiscal é equiparável à penhora antecipada e viabiliza a certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo.
3. É viável a antecipação dos efeitos que seriam obtidos com a penhora no executivo fiscal, através de caução de eficácia semelhante. A percorrer-se entendimento diverso, o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco não se voltou judicialmente ainda.
4. Deveras, não pode ser imputado ao contribuinte solvente, isto é, aquele em condições de oferecer bens suficientes à garantia da dívida prejuízo pela demora do Fisco em ajuizar a execução fiscal para a cobrança do débito tributário. Raciocínio inverso implicaria em que o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco ainda não se voltou judicialmente.
5. Mutatis mutandis o mecanismo assemelha-se ao previsto no revogado art. 570 do CPC, por força do qual era lícito ao devedor iniciar a execução. Isso porque as obrigações, como vínculos pessoais, nasceram para serem extintas pelo cumprimento, diferentemente dos direitos reais que visam à perpetuação da situação jurídica nele edificadas.
6. Outrossim, instigada a Fazenda pela caução oferecida, pode ela iniciar a execução, convertendo-se a garantia prestada por iniciativa do contribuinte na famigerada penhora que autoriza a expedição da certidão. (Omissis)
10. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(STJ, REsp 1.123.669/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010)

Ao julgar o REsp. 1.123.669/RS, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 01.02.2010, representativo da controvérsia, o STJ assentou o entendimento de que, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, o contribuinte pode garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter Certidão Positiva de Débitos com Efeito de Negativa. (...).
(STJ, AgRg no REsp 1357936/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/11/2013, DJe 03/12/2013)

Aliás, quanto à necessidade de ajuizamento do procedimento principal, veja a brilhante exposição do Professor Kyioshi Harada :

Uma vez concedida a liminar não haverá necessidade de ajuizar a ação principal a despeito do art. 796 do CPC considerar o procedimento cautelar sempre dependente do processo principal.
É que o provimento jurisdicional ordenando a expedição da certidão tem natureza satisfativa a afastar a incidência dos artigos 108, 109 e 800 do CPC.
Não faz sentido apegar-se à literalidade dos textos processuais para exigir uma inútil e desnecessária ação principal para confirmar o que já foi decidido em sede de ação cautelar, conspirando contra o princípio da economia processual e o princípio da razoável duração do processo.

Corrobora com esse raciocínio, a jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. OFERECIMENTO DE CAUÇÃO QUE VISA A EMISSÃO DE CND E A GARANTIA DE FUTURA EXECUÇÃO FISCAL. SATISFATIVIDADE.
1. É satisfativa a medida cautelar que visa o oferecimento de caução para emissão de certidão positiva com efeito de negativa, bem como garantir futura execução fiscal mediante penhora.
2. Esta Corte considera que "a natureza satisfativa da medida cautelar torna desnecessária a postulação de pedido em caráter principal". Precedentes: REsp 851.884/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 29.10.08; REsp 805113/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJe 23.10.08; REsp 684.034/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 19.12.07; REsp 541.410/RS, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJU 11.10.04.
Agravo regimental improvido.
(STJ, AgRg no AREsp 112.823/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2012, DJe 14/09/2012)