terça-feira, 16 de julho de 2013

AS TESES DOS CINCO MAIS CINCO DO STJ

O art. 173, inciso I do CTN ensina que o direito da Fazenda Pública de constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado e não foi. Por exemplo, se o lançamento (independentemente de sua modalidade) deveria ter sido efetuado até maio de 2012 e não foi, o prazo decadencial do direito da Fazenda Pública constituir tal crédito tributário iniciaria no dia 01/01/2013 e terminaria 5 anos após, em 01/01/2018.
Já o art. 150 do CTN, que trata do lançamento por homologação, em seu § 4º ensina que a Fazenda Pública terá cinco anos para homologar a antecipação do pagamento feita pelo contribuinte, contados do fato gerador. Caso ela não se manifeste neste prazo, considerar-se-á homologado o “lançamento”* e extinto o crédito tributário, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
Ao interpretar ambos dispositivos, em 1995, o STJ concluiu que, quanto aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, após a ocorrência do evento (fato gerador in concreto) contar-se-ia cinco anos para que o Fisco procedesse à homologação (art. 150, §4º); caso isso não ocorresse, no primeiro dia do exercício seguinte seria iniciada a contagem de mais cinco anos para que o Fisco procedesse ao lançamento de ofício (art. 173, inciso I). O ilustre professor Eduardo Sabbag explica com clareza a situação:
“Curiosamente, o STJ, a partir de 1995, passou a entender viável a cumulação de prazos, concebendo os dois artigos – art. 173, I e art. 150, §4º - como normas cumulativas ou concorrentes, isto é, não reciprocamente excludentes. Assim, o prazo decadencial passou a encontrar lastro na intitulada tese dos cinco mais cinco (5+5), por meio da qual o dies a quo do prazo do artigo 173 é o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do artigo 150, § 4º.”
Os seguintes recursos são bons exemplos da aplicação desse entendimento: RESP 69.308 – 1995; EResp 132.329 – 1999; RESP 198.631 – 2000.
Desse modo, havia quem dissesse que o prazo decadencial do direito do Fisco constituir o crédito tributário seria de 10 anos, contados da ocorrência do evento, nada obstante os dizeres expressos da legislação. No entanto, não é bem assim, pois o início do segundo prazo de cinco anos não começa a contar no dia seguinte ao término do primeiro prazo, mas apenas no primeiro dia do ano seguinte. O professor acima citado exemplifica:
“À luz do entendimento do STJ, no bojo da tese dos cinco mais cinco (5+5), o tributo com fato gerador em 15-02-1995, em que tenha havido falta de pagamento, poderá ser objeto de lançamento até 31-12-2005 (dies ad quem), ou seja, aproximadamente onze anos a contar do fato gerador.”
São inúmeras as críticas doutrinárias à adoção desse posicionamento, pois o § 4º do art. 150 diz que, expirado o prazo da homologação, deve-se considerar definitivamente extinto o crédito tributário. Assim, para que conceder mais cinco anos para a Fazenda Pública efetuar o lançamento de ofício, se, conforme prescreve a legislação, o crédito tributário já estaria extinto? Segue no mesmo sentido as críticas trazidas por Eduardo Sabbag:
  “... o STJ, ao considerar o dies a quo como o dia em que se deu a perda do poder de lançar, desloca para o infinito a ocorrência da decadência. (...)
Ademais, a solução é mesquinha e lamentável do ponto de vista dos direitos do cidadão porquanto mais que duplica o prazo decadencial de cinco anos. Perguntar-se-á: qual a lógica em somar, ao primeiro lustro, um novo prazo quinquenal de decadência, quando o lançamento já não pode ser efetuado, haja vista já se encontrar definitivamente extinto o crédito?”
Atualmente, este posicionamento foi superado e a jurisprudência consolidada do STJ ensina que a decadência do direito do Fisco constituir o crédito tributário é regida pelo art. 150, § 4°, do CTN, quando se trata de tributo sujeito a lançamento por homologação e o contribuinte realiza o respectivo pagamento parcial antecipado, sem que se constate a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. No entanto, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo não ocorre, aplica-se o art. 173, I, do CTN. Observe:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL. ARTIGO 173, I, DO CTN. APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN. IMPOSSIBILIDADE.
1. O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito (Precedentes da Primeira Seção: REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008; AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; e EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005).
2. É que a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa no perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento, e, consoante doutrina abalizada, encontra-se regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a regra da decadência do direito de lançar nos casos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício, ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado (Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 163/210).
3. O dies a quo do prazo quinquenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o "primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado" corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, "Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro", 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs.. 91/104; Luciano Amaro, "Direito Tributário Brasileiro", 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs.. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs.. 183/199).
5. In casu, consoante assente na origem: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação; (ii) a obrigação ex lege de pagamento antecipado das contribuições previdenciárias não restou adimplida pelo contribuinte, no que concerne aos fatos imponíveis ocorridos no período de janeiro de 1991 a dezembro de 1994; e (iii) a constituição dos créditos tributários respectivos deu-se em 26.03.2001.
6. Destarte, revelam-se caducos os créditos tributários executados, tendo em vista o decurso do prazo decadencial quinquenal para que o Fisco efetuasse o lançamento de ofício substitutivo.
7. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.
(STJ, REsp 973.733/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 18/09/2009).
Outrossim, deve-se tomar cuidado para que não se confunda a malfadada tese criada pelo STJ com a aplicação dos prazos de decadência e prescrição trazidos, respectivamente, pelos arts. 150/173 e 174 do CTN. Isto porque a Fazenda Pública possui cinco anos para constituir o crédito tributário e, após tal constituição definitiva, possui mais cinco anos para ajuizar a ação de cobrança desse crédito, ou seja, a execução fiscal. Anis Kfouri Jr. explica essa última situação:
“Considerando que o art. 174 do CTN estabelece que o prazo para prescrição tem início com a constituição definitiva do crédito tributário e, considerando que § 4º do art. 150 do mesmo Código estabelece que a homologação do tributo ocorre somente após decorridos 5 anos do fato gerador, chegou-se à conclusão lógica, em breve resumo, que a partir do fato gerador seriam aplicáveis 5 anos para sua constituição definitiva e a partir de então o prazo de 5 anos previsto no art. 174 relativo a prescrição, interpretação que ficou conhecida como 5+5. (...)
Imaginemos que um tributo teve fato gerador em 2005, não tendo sido lançado, o que só ocorreu nos últimos dias antes de operar-se a decadência, em 2010, com a lavratura do auto de infração. Dessa forma, a partir de então, desde que definitivamente constituído, conta-se o prazo de 5 anos relativos à prescrição, que poderia chegar a 2015.”
Por fim, há ainda uma terceira hipótese que também é conhecida como Tese dos Cinco Mais Cinco, relativa ao direito do contribuinte pleitear a restituição do pagamento indevidamente efetuado. Nessa seara, o art. 168, inciso I do CTN ensina que o prazo prescricional quinquenal começa a ser contado após a extinção do crédito tributário.
O STJ entendeu então que, no caso dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, tal extinção ocorreria com a homologação do pagamento, momento em que se iniciaria a contagem do prazo prescricional da repetição de indébito, ou com o transcurso do prazo decadencial previsto no art. 150, § 4º, CTN, caso em que teríamos o transcurso de cinco anos após a ocorrência do evento e, depois da homologação tácita, os cinco anos para o contribuinte pleitear a repetição de indébito. O Ministro João Otávio de Noronha do STJ explica:
“Para a pretensão contida na ação de repetição de indébito de tributo sujeito a homologação, o Superior Tribunal de Justiça consagrou a tese dos "cinco mais cinco", ou seja, o prazo prescricional é de cinco anos contados da homologação, a qual, se tácita, ocorre depois de transcorridos cinco anos do fato gerador.” (EREsp  998.678/RS, DJe 26/06/2013)
Todavia, o advento da Lei Complementar nº 118 de 2005 alterou tal posicionamento, pois determina que a extinção do crédito tributário mencionada no art. 168, inciso I do CTN ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.
Tal tema exige delongada explanação, razão pela qual convido o leitor a ler o próximo texto aqui publicado, intitulado “A LC 118/05 e a Repetição de Indébito”. Adianto apenas que atualmente o STJ aplica o prazo de cinco anos previsto no art. 168, inciso I do CTN, contado da data do pagamento, para as demandas ajuizadas após o início da vigência da referida LC, ou seja, 09.06.2005.

Observação:
"Lançamento"* - Para quem acredita que o lançamento não é ato privativo do Fisco, o dispositivo foi redigido corretamente, uma vez que o contribuinte, ao antecipar o pagamento e cumprir com suas obrigações acessórias, estaria, de fato, lançando o tributo, ainda que tal lançamento possa ser revisado posteriormente pelo Fisco. No entanto, para aqueles que acreditam ser o lançamento ato privativo do Fisco, conquanto o mesmo fica a mercê da homologação – expressa ou tácita – do Fisco, o dispositivo se referiria então ao pagamento realizado pelo contribuinte. Assim, caso o contribuinte não tenha antecipado o pagamento, não haveria o que o Fisco homologar, razão pela qual o prazo decadencial aplicável seria o previsto no inciso I do art. 173 do CTN, ignorando-se o do art. 150, §4º. 
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Anis Kfouri Jr. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2010. Pg. 241/242.

Eduardo Sabbag. Manual de Direito Tributário. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. Pg. 791/793.






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